Muito tempo se passou desde que li
pela primeira vez na internet sobre ovodoação. Me lembro de, na época do meu
diagnóstico de menopausa precoce, não encontrar nada a não ser dados de clinicas
de fertilização ou sites que falavam de maneira muito direta (e fria) que
mulheres com FSH alto só podem engravidar usando óvulos de outras mulheres.
Aquilo não me ajudou muito, pelo contrário! Me fez entrar em desespero. O material no Brasil ainda é escasso...
Hoje vejo que muita coisa mudou de lá
pra cá. Quase 10 anos de passaram e,
tanto a visão das pessoas, como das doadoras e até do Conselho Federal de
Medicina mudou!
Em maio de 2013 foi publicada a nova resolução
do Conselho Federal de Medicina (Resolução
CFM Nº 2.013/2013) que trata das
normas éticas a serem adotadas no tratamentos de reprodução assistida. Esta resolução revogou a anterior de 2010 (Resolução CFM Nº 1.957/2010) com algumas
pequenas alterações. Na verdade a grande
modificação ocorreu desta de 2010 para a primeira, que foi publicada em 1992
(Resolução CFM Nº 1.358/92). Antiga não? Pois é, em 1992 já se pensava nos
aspectos éticos que envolviam esse tipo de tratamento. Na verdade nem tão
antiga assim se pensarmos que o primeiro bebê de proveta nasceu em 1979.
Preste
atenção! Esta é a resolução do Conselho Federal de Medicina. Ela ORIENTA os
médicos quanto às
condutas a serem adotadas diante dos problemas decorrentes da prática da
reprodução assistida, mas não é uma LEI! No Brasil, até o momento não há
legislação específica a respeito da reprodução assistida. Existem projetos de
lei que transitam no Congresso Nacional, há anos, mas nenhum deles foi para
votação.
Bom, o post
de hoje é para falar sobre alguns pontos relacionados a doação de gametas, que
são abordados nesta última resolução do CFM.
A grande novidade
que apareceu nesta última resolução é que o Supremo Tribunal Federal reconheceu e qualificou como entidade
familiar a união estável homoafetiva, permitindo, entre outras coisas, que
casais homossexuais possam se submeter a tratamentos de fertilização. Outra novidade
foi o estabelecimento da idade máxima de 50 anos para as candidatas à gestação.
Em 2010 passaram a estabelecer o número máximo de embriões que podem ser
transferidos para a paciente de uma vez. Esse número varia conforme a idade:
a) mulheres
com até 35 anos: até 2 embriões;
b) mulheres entre
36 e 39 anos: até 3 embriões;
c) mulheres
entre 40 e 50 anos: até 4 embriões;
d) nas situações de doação de
óvulos e embriões, considera-se a idade da doadora no momento da coleta dos
óvulos.
Com relação aos aspectos relacionados a
doação de gametas eu copio o texto na íntegra e faço alguns comentários
pessoais em itálico!
IV - DOAÇÃO
DE GAMETAS OU EMBRIÕES
1 - A doação nunca terá caráter lucrativo ou
comercial.
Esse é um
aspecto que varia de país para país. Em alguns lugares, como os EUA, é
permitida a venda de óvulos e espermatozóides. Eu particularmente sou contra a
venda de gametas. Falarei sobre isso num outro post.
2 - Os doadores não devem conhecer a identidade
dos receptores e vice-versa.
Na minha
opinião isso é muito importante. Já relatei que tentei fazer ovodoação com
óvulos da minha irmã e hoje acho muito bom que isso não tenha ido adiante. Acho
que teríamos problemas em função das diferenças de criação de nossos filhos.
3 - A idade limite para a doação de gametas é
de 35 anos para a mulher e 50 anos para o homem.
Faz sentido,
levando em consideração que os óvulos das mulheres também envelhecem, e a partir dos 35 anos podem tornar-se menos capazes de ser fertilizados pelos espermatozóides e
são mais propensos a apresentar alterações genéticas.
4 - Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre
a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores. Em
situações especiais, as informações sobre doadores, por motivação médica, podem
ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil
do doador.
Em alguns países é permitido conhecer a identidade. Mas imaginem se o
doador resolve procurar e querer a participar de tudo que acontece na vida do
filho genético. Passaremos a ter um filho compartilhado?
5 - As clínicas, centros ou serviços que empregam
a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de
caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular
dos doadores, de acordo com a legislação vigente.
Fico na dúvida se isso é viável. E no caso de uma clínica fechar? Não entendo
de questões jurídicas. Fico pensando se daqui a 40 anos todas essas clínicas
continuarão a existir. Outra questão é o local de armazenamento. Se forem
folhas estão sujeitas a um
acidente como incêndio. Se estiverem na rede (internet) estão sujeitas ao
ataque de raquers ou mesmo de um vírus. Será que são seguros tais locais?
6 - Na região de localização da unidade, o
registro dos nascimentos evitará que um(a) doador(a) tenha produzido mais que
duas gestações de crianças de sexos diferentes, numa área de um milhão de
habitantes.
Faz sentido
para evitar um possível encontro de irmãos genéticos. Será que a clínicas tomam
este cuidado? Acho que não. Se o acompanhamento da gestação não é feito todo na
clínica eles não tem como saber o sexo do bebê, muito menos se nasceu. No meu
caso, eu tive “alta” da clínica com 3 meses e a partir dai fui acompanhada pela
minha ginecologista. Com 3 meses só dá para saber o sexo da criança se fizer o
teste de sangue (que é caro). Meu médico da clínica só soube do nascimento
porque eu o procurei depois para conversar.
7 - A escolha dos doadores é de responsabilidade
da unidade. Dentro do possível, deverá garantir que o doador tenha a maior
semelhança fenotípica e imunológica e a máxima possibilidade de compatibilidade
com a receptora.
Vejo que
muitas clinicas oferecem fotos das doadoras quando crianças, ou então fichas
com as características físicas e de personalidade. Ou seja, quem escolhe é o
receptor no caso de uma doação compartilhada.
8- Não será permitido ao médico responsável
pelas clínicas, unidades ou serviços, nem aos integrantes da equipe
multidisciplinar que nelas prestam serviços, participarem como doadores nos
programas de RA.
Parece razoável!
É só lembrar daquela novela que a secretária doa seus óvulos e a médica
fertiliza com os espermatozóides do irmão dela que morreu e era namorado da
secretária. Quando ela descobre, resolve ir atrás do filho. E assim segue a
novela!
9 - É permitida a doação voluntária de gametas,
bem como a situação identificada como doação compartilhada de oócitos em RA,
onde doadora e receptora, participando como portadoras de problemas de
reprodução, compartilham tanto do material biológico quanto dos custos
financeiros que envolvem o procedimento de RA. A doadora tem preferência sobre
o material biológico que será produzido.
Essa foi uma
novidade na resolução. Já era uma prática nas clínicas. O problema é que, neste
caso, a receptora paga um custo muito alto pelo tratamento. Acho injusto a
forma como as clinicas conduzem isso, pois, desta forma, a receptora paga o
pacote dela todo e mais, parte ou todo, o tratamento da doadora. Só que neste
caso a doadora é quem passa por um processo maior, pois envolve o acompanhamento
e aspiração dos óvulos. A receptora só faz um acompanhamento para sincronizar o
ciclo. Neste caso eu acho que o valor do tratamento da receptora deveria ser
menor e assim ela pudesse arcar também com os custos da doadora.
Taí um bom tema para um
outro post também...
E você? O que acha desta última
resolução do CRM? Quais aspectos você acha que deveriam ser tratados numa lei
brasileira sobre doação de gametas?
Caso queira ler as Resoluções na íntegra é só clicar!